domingo, 24 de abril de 2011

um caso de amor(?) o amor é lindo(!)

SEDA: uma estória de amor
Diário Gauche


 
O leitor certamente ficou intrigado com o título, que merece uma explicação. SEDA é uma nova secretaria que está sendo criada na Prefeitura de Porto Alegre (foto). O seu projeto foi enviado à Câmara há alguns dias pelo prefeito Fortunati. Trata-se de uma secretaria especial dos direitos animais, destinada, de acordo com a justificativa anexa ao projeto, “a executar políticas públicas destinadas à saúde, proteção, defesa e bem-estar animal”. A sua aprovação é praticamente certa, pois o executivo tem ampla maioria no legislativo municipal.


Além disso, quem iria se posicionar contra? Os animais domésticos – especialmente os cães e os cavalos, – tem a simpatia e a estima de todos.


Constituem uma unanimidade na nossa cidade, no estado, no país e no mundo. Existem algumas exceções, é claro. Há alguns raros países, localizados em remotos recantos da África e da Ásia – povos bárbaros -, onde a fome ou um velho e péssimo hábito ancestral os impele ainda a persistir no abate e no consumo de carne de cães e/ou cavalos. Como então, votar contra sua defesa e preservação? Eu mesmo gosto dos animais, embora, é claro, ame muito mais os humanos e ache que o poder público pode e deve fazer muito mais por eles.


A primeira motivação da SEDA está explicada, é o extremado amor pelos animais; falta explicar a segunda, singular, específica, que é o imenso carinho que a primeira dama do Paço tem por eles. Ela é a mentora intelectual da SEDA. De sua inspiração e trabalho surgiu o projeto. Segundo a imprensa, foram dezenas de horas de febril labor, sacrifício do lazer de fins de semana, troca de idéias e consultas ao co-autor, seu “cara metade”, o prefeito Fortunati.


Como se viu, tudo muito edificante, não fosse o fato de que o episódio narrado ilustra um constrangedor exemplo de mistura, de relação não desejada do interesse particular com o público. Intimidade que a experiência tem demonstrado resulta quase sempre em resultados desastrosos, por melhores que sejam as intenções.


Ponto um, básico: o projeto da SEDA prevê a criação de 7 CCs (cargos em comissão) e de mais 14 funções gratificadas e não prevê cargos de provimento efetivo a não ser os de chefia, como de veterinários e de administradores, por exemplo. Segue o equivocado modelo que orientou a criação de outras quatro micro-secretarias fantasmas – da Juventude (SMJ), do Turismo (SMTUR), da Copa (SECOPA) e da Acessibilidade (SEACIS) e de um gabinete, o INOVAPOA.


Terminado o governo os CCs e os detentores de chefias são substituídos por outros. Um órgão estruturado com CCs não tem memória nem objetivos de médio e longo prazo. Se olharmos a execução orçamentária por projeto desses órgãos, vamos verificar que ocorre em 2011 o que já aconteceu em 2010: o INOVAPOA e as micro-secretarias não fizeram nada. Este ano, já quase no final do quarto mês, dos 28 projetos programados 25 não foram sequer iniciados, quatro tiveram tímido começo. Os investimentos – obras e equipamentos - necessários à sua estruturação até hoje não foram realizados. Nos seus orçamentos predomina o registro do pagamento de CCs e da contratação de serviços de terceiros. A SMJ, por exemplo, tem 15 CCs e nenhum funcionário concursado, de carreira. E justamente nessa secretaria existem graves denúncias de desvios e de corrupção, objeto de uma CPI em andamento. A SEACIS (Acessibilidade) tem um funcionário efetivo e seis CCs; o INOVAPOA está no gabinete do prefeito onde perambulam 53 CCs. Os dados são absolutamente oficiais, constam no Portal da Transparência da Prefeitura.


Quase todos os governos, exceções são raras, especialmente no seu começo, criam CCs para acomodar a “turma da casa” ou para viabilizar a vinda de colaboradores mais qualificados. O governo Fo-Fo, todavia, exagerou. Em apenas seis anos duplicou o número de Cargos em Comissão na Prefeitura. Somando os CCs previstos para a SEDA, serão cerca de 500, só nas secretarias, praticamente o dobro do existente em 2004. Se considerarmos os CCs dos departamentos e das empresas municipais, chegamos nos novecentos. Além dos CCs, temos na Prefeitura cerca de 3 mil e duzentos estagiários.


O custo total deste verdadeiro “exército” supera os 80 milhões de reais/ano, valor que corresponde ao total do orçamento de uma prefeitura de cidade média, e superior ao da maioria das pequenas cidades do nosso interior.


Artigo do economista Paulo Muzell.

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